quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

INSÔNIA de Diego Callazans


 já passa do momento
de ser algo.
o pé moldou o sapato.

vieram as reticências e o mais
da vida é inércia;
não insista.

a sorte caleja aos 30.
e o sono se vai
às 3.

Diego Callazans é um poeta contemporâneo brasileiro, nascido em Ilhéus, Bahia, a 6 de julho de 1982. O poeta cresceu, no entanto, em Aracaju, Sergipe, onde vive desde os 5 anos.  Publicou A poesia agora é o que me resta (2013), Nódoa (2015) e a plaquete Blasfêmias (2015). Os poemas abaixo formam seu livro ensejos, que publicamos na íntegra aqui.
 

 


RACHAR UM ÁTOMO E DEPOIS de Ricardo Escudeiro

quando as palavras esgotam
o possível

ah
já iam além de cansadas né
despossessas

esfoliação de núcleos
cirúrgico procedimento
alongando e abreviando
corpos e fronteiras
entre vivido e imaginado
inventado e deveras visto

palavra
des comungam
com as coisas elas mesmas
objetos fracta

e não há já mais nomenclatura eh
só fluxo
ondas de vozes

história
a flor
ah essa é mais embaixo

mas e o poeta ele mesmo
ah esse
se faz mais que a carne e o tempo in verso
poltergeist que nos tenta
dá pras gentes o que não
é de gente

contatamos com o plano etéreo


Ricardo Escudeiro nasceu em Santo André-SP, em 1984, onde vive. É autor dos livros de poemas rachar átomos e depois (Editora Patuá, 2016) e tempo espaço re tratos (Editora Patuá, 2014). Graduado em Letras na USP, desenvolve projeto de mestrado com interesse em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa e Estudos de Gênero. Assina a coluna desglutição, no Portal Heráclito. Atua no ensino fundamental II e no ensino médio. Possui publicações em mídias digitais e impressas: site da Revista CULT, Mallarmargens-revista de poesia e arte contemporânea, Germina-Revista de Literatura & Arte, Jornal RelevO, Revista Nefelibata, Revista Gente de Palavra, Revista SAMIZDAT, 7faces caderno-revista de poesia, Revista Pausa, Flanzine (Portugal), Revista Carlos Zemek, Revista Mortal. Publica poemas mensalmente na Revista Soletras, de Moçambique.

 

CARTA AO IRMÃO DISTANTE de Adroaldo Barbosa Jr.



Meu querido irmão,
Bom dia!
Que o raiar do dia
Brilhe em seu rosto
E brilhe em sua vida!
Que os seus dias
Sejam ricos
De alegria.
Meu amado
E querido
Irmão,
Estamos vivos!
Tenho de lhe dizer:
Estamos vivos!
Você
Não está
Sozinho!
Você está
No meu coração
E na minha alma.
Você está
Dentro de mim
E no reflexo da água.
Você é parte de mim
E eu sou parte
De você!
Nós somos um
Dentre
Todos os outros.
Nós não
Estamos
Sozinhos.
Que o dia
Testemunhe
Nosso nascimento!
Que a aurora
Perceba
A nossa existência!
Que os campos
Recebam
Os nossos passos!
Que o mundo
Aceite
A nossa presença!
Meu irmão,
Meu querido
E amado Irmão,
Há tempos
Tento lhe falar
Uma coisa:
Eu estou aqui!
Me escute:
Eu estou aqui!
Você
Não está
Sozinho!
Eu preciso
Desesperadamente
De você.
Eu preciso
Desesperadamente
Saber de você.
Eu preciso
Desesperadamente
Estar com você!
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
A minha tenda
Está aberta
A você
Caso queira
Se esconder
Dessa noite fria.
A minha tenda
Está aberta
A você
Caso queira
Enganar
A fúria dos lobos.
Meu coração
Está ligado
Ao seu.
Meu sangue
É vermelho
Assim como o seu.
Nem o tempo
Pode apagar
Isso.
Nem a própria vida
Pode apagar
Isso.
Meu irmão,
Quem será você
Nessa multidão?
Abraçará a verdade
Ou fará parte
Da ilusão?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Percebe
A escuridão
Que se aproxima?
Percebe
O mal
Que agora cresce?
Escuta o som
Do trovão
Ao longe!
Escuta o som
Das trombetas
Ao longe!
Escuta
O bater de asas
Dos gafanhotos!
Escuta
Os gritos da turba
Furiosa!
A multidão
Que nos persegue
Insistentes
Têm fome
De sangue
Entre os dentes.
Todos querem
Um pedaço
De nós.
Todos desejam
Uma libra
De nossa carne.
Eles vêm
Durante
A noite.
Eles vêm
Durante
O dia.
Eles
Nunca
Dormem.
Eles
Nunca
Desistem.
Eu vejo somente
Ódio
Em seus olhos.
Eu vejo somente
Rebeldia
Em seus olhos.
Eles nascem
Dos murmúrios
E contendas.
Eles são frutos
Da raiva
E da hipocrisia.
Eles veneram
Ídolos
De mármore.
Ídolos de ouro,
Prata
E bronze.
Eles Clamam
Um pedaço
De nossa terra.
Eles Exigem
Até mesmo o suor
De nossa testa.
Não há alimento
Nesta terra
Que sustente,
Pois, sua
Fome
É desmedida.
Não há cobertor
Nesta terra
Que aqueça,
Pois, seu coração
É o frio do inverno
Mais extremo.
Não há justiça
Nesta terra
Que satisfaça,
Pois, esperam
Que o mal maior
Sempre prevaleça.
Não há razão
Pra que nada disso
Aconteça
E, ainda assim,
Tudo
Acontece!
Quem
Pôs nossos irmãos
Contra nós?
Quem
Nos pôs contra
Nossos próprios irmãos?
Quem nessa Terra,
Realmente,
Somos nós?
Quem nessa Terra,
Realmente,
São eles?
Quem sabe
De que lado estamos
Do espelho?
Todo esse ódio
Não nasce sozinho
Nas dunas.
Toda essa raiva
Não cresce sozinha
Na areia.
Então, quem nos odeia tanto
Querido e amado
Irmão?
Quem, há tempos,
Tem nos jogado
Um contra o outro?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Alguém, há tempos,
Rouba
Todo o nosso gado.
Alguém, há tempos
Contamina
Toda a nossa água.
Alguém, há tempos,
Assalta
Os nossos sonhos.
Alguém, há tempos,
Queima
Tudo o que nos resta.
Mas, quem nos odeia
Há tanto tempo,
Amado irmão?
A culpa
De tudo isso
Não é sua.
A culpa
De tudo isso
Não é minha.
Então de quem será,
Na verdade,
Toda a culpa?
Quem será,
Afinal, o nosso
Único acusador?
Quem vem
Para roubar
Todo o nosso fôlego?
Quem vem
Para destruir
As nossas esperanças?
Quem
Nasceu
De uma contenda?
Quem
Nasceu
De uma simples mentira?
Quem rasteja
Entre os lagartos
Do deserto?
Quem conversa
Com as estrelas
Do infinito?
Contra seus
Próprios irmãos?
Quem blasfema
Contra os céus
E o próprio criador?
Quem será
O nosso maior
Assassino?
Quem será
O nosso maior
Adversário?
Quem será
Nosso irmão
Desconhecido?
Quem irá
Quebrar o silêncio
Nesse fim tão violento?
Meu irmão,
Imploro que me salve
Dessas ruas sujas.
Imploro que me abrace
Nessa noite
Tão fria e tão escura.
Imploro que me conceda
Uma simples oração
Nesse silêncio momentâneo.
Alguém trama
Constantemente
Contra nós.
Alguém
Quer ver
O nosso fim.
Meu irmão,
Querido e amado
Irmão,
Me abrace
Quando o vento
For gelado demais.
Me abrace
Quando ouvir
Meu suspiro de dor.
Minhas mãos
Tremem
De frio e de medo.
Meus ossos
Tremem
De frio e de medo.
Meu irmão,
Onde você estará
Agora?
Você estará
Dentro dos carros
Que passam velozes?
Você estará
Nas vitrines
Das lojas de roupas caras?
Você estará
Nos outdoors de neon
No centro da cidade?
Você estará
Nas propagandas
De marcas famosas?
Onde você
Estará,
Meu amado irmão?
O som
Do trovão
Se aproxima!
Quase
Explode
Meu coração!
Meus ossos
Tremem
De frio e medo.
Eu espero
Por algo
Que não me deve explicação.
Eu espero
Por algo
Que não compreendo.
Eu espero
Por algo
Que seja uma revelação.
Decerto
Surja
Entre os cactos.
Decerto
Cresça
Entre a grama queimada.
Decerto
Seja apenas
Mais um sonho.
Decerto
Seja apenas
Outro desejo escondido.
Meu irmão,
Nesse dia especial,
Quem será você hoje?
Nesse dia especial,
Onde estará
Você hoje?
Será você,
Meu irmão,
Meu único amigo?
Será você,
Meu irmão,
Meu maior inimigo?
Estará você,
Irmão, ao meu lado
Nessa noite fria?
Estará você,
Irmão, junto
À turba furiosa?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Será você
Aquele
Que dorme ao relento?
Será você
Aquele que
Luta contra o frio?
Será você
Aquele
Que enfrenta os lobos?
Será você
Aquele
Que protege os seus?
Quem será
Você,
Meu querido e amado irmão?
Meu irmão,
Eu imploro
Que me receba.
Meu irmão,
Eu suplico
Que me ouça.
Meu querido
E amado irmão,
Me aceite!
Me perceba,
Me entenda
E me acolha.
Me aceite
Do jeito
Que eu sou!
Me receba
Em sua tenda
Nessa noite fria.
Me aceite
De braços abertos
Nessa noite tão escura.
Me acolha
Nesses dias
Tão sombrios.
Me proteja
Desses dias
Tão terríveis.
Meu amado
E querido irmão,
Me abrace.
Eu preciso
Muito
Que você me abrace.
Eu necessito
Do ar
Que tu respiras.
Eu necessito
Do endereço
Dos teus passos.
Eu preciso
Ouvir
A tua voz rouca
Mesmo
Que seja
Por um mísero instante.
Mesmo
Que seja
Por um mísero segundo.
Mesmo
Que não diga
Absolutamente nada.
Mesmo
Que me diga
Absolutamente tudo.
Eu preciso
Que escute
Eu abrir meu coração
Nem que seja
Apenas
Por um segundo
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Eu sinto
Todo o frio
Que se avizinha.
Eu vejo
Todo o medo
Que não se explica.
Eu preciso
Tanto
De você!
Eu preciso
Que você
Esteja aqui por perto
E me aqueça
Caso esse frio
Persista.
Eu preciso
Que você
Me proteja
Caso
Todo o mal
Me alcance.
Eu necessito
Tanto
De você!
Eu preciso
Que me guie
Nessa noite densa.
Eu preciso
Que me esconda
Da fome dos lobos.
Que dissipe
Todos
Os meus medos,
Que lave
Todos
Os meus pecados,
Que seque
Até mesmo
As minhas lágrimas,
Que lute
Por mim
Com todas as suas forças.
Eu preciso
Tanto de você,
Meu querido irmão.
Eu gostaria tanto de
Poder tocar
Seu rosto mais uma vez.
Eu gostaria muito
De sentir
A sua pele mais uma vez.
Eu preciso tanto
Ouvir
A sua voz mais uma vez.
Eu preciso
Sentir
A sua presença mais uma vez.
Eu preciso
Que me abrace;
E que seu abraço seja sincero.
Eu preciso
Que me diga
Para não ter mais medo.
Eu preciso
Que me diga
Que vai dar tudo certo!
O som do trovão
É ensurdecedor
E se aproxima cada vez mais.
A fome dos lobos
Não cessa
Nem diante do crepúsculo.
Vejo cidades inteiras
Ardendo
Em chamas.
Vejo a escuridão
Mais negra
Tomar corpo rapidamente.
Vejo a perdição alimentar-se
Satisfeita
De um rebanho de ovelhas.
Vejo o rebanho abraçar a noite
E se juntar
À alcatéia.
Vejo lobos
E ovelhas
Confraternizando.
Vejo-os abraçar
O mal completo
Em um pacto noturno.
Diante de meus olhos,
Finalmente,
Eu vejo o fim que se descortina.
Escuto o som do trovão,
Finalmente,
Em sua plenitude.
Não há mais
Venda alguma
Em meus olhos.
Vejo milhões
Emitirem seu último suspiro
Diante de meus olhos.
Meu irmão,
Meu querido e amado
Irmão,
Como posso dizer
O quanto
Eu te amo?
Como posso dizer
O quanto
Você fará falta?
Como posso dizer
O quanto
Eu amei você nessa vida?
Como posso olhar
Em seus olhos
Sabendo que nunca mais te verei?
Quem pôs
Esse sangue
Em minhas mãos?
Quem pôs
Essa arma
Em minhas mãos?
Meu querido
E amado
Irmão,
Onde
Estará
Você?
Estará
Você
Nas plantações de algodão?
Estará
Você
Nas minas de carvão?
Estará
Você
Nas mesas de bar?
Estará
Você
Nas canções de ninar?
Estará
Você
Nas masmorras de pedra?
Estará
Você
Nas páginas amarelas?
Estará
Você
Nas montanhas do deserto?
Estará
Você
Nas florestas de concreto?
Estará
Você
Nas cartas de amor?
Estará
Você
Nas histórias de terror?
Estará
Você
Entre os perseguidos
Ou estará
Entre
Os que perseguem?
Estará você
Entre
Os de barriga vazia
Ou estará
Entre
Os que tem de tudo?
Estará você
Entre
Os mais populares
Ou estará
Entre
Os descartáveis?
Estará você
Entre
Os colonizadores
Ou estará
Entre
Os colonizados?
Meu irmão,
Meu querido
E amado irmão,
Estará você
Entre
Os eleitos?
Estará você
Entre
Os desafortunados?
Meu irmão,
Querido
E amado irmão,
Abrace
Meus
Problemas,
Abrace
Minhas
Lutas,
Abrace
Minhas
Lágrimas,
Abrace
Meus
Soluços,
Abrace
Minhas
Cicatrizes,
Abrace
Minhas
Esperanças,
Abrace
O que me é
Mais caro...

ADROALDO BARBOSA JR. é um poeta brasileiro residente na cidade de Foz do Iguaçu/PR. Considerado um poeta maldito é conhecido apenas em círculos específicos e não é vasto o material encontrado que leva a sua assinatura. Participou de algumas coletâneas poética brasileiras e seus livros são vendidos através da Amazon em formato e-book. De acordo com seu site pessoal e dados obtidos através de outras redes sociais, trata-se de um professor especializado em redações. Parece ter trabalhado até como frentista antes de se tornar um poeta, mas, a informação ainda carece de uma verificação mais aprofundada. Sua verve literária parece sofrer influências de autores como Florbela Espanca e Raymond Chandler. Um poeta com uma escrita simples (sem ser simplista) e ao mesmo tempo interessante.